quarta-feira, 27 de maio de 2009

olho pela janela e encontro
palavras suspensas no varal
atônitas, procurando uma boca
ávida por desejar.

lá esvoaçam, não obedecendo
a nenhum padrão, soltinhas
minimamente presas aqui e ali
prontas a voar.

esboça um tango, a vermelha
cheia de si carrega a ventura
como a passar a mão pela cintura
de quem não há.

uma azul esbranquiçada e mansa
baila num rodopio infinito
faz tremer qualquer ciência
que lhe queira dissecar.

a verde, paciente medita
em uma nobre e casta solução
não cede fácil aos caprichos
modera então.

as palavras procuram bocas
pra serem ditas, ouvidas
pra sonhos alimentar.

quando chegar esse dia,
todas elas, no varal estendidas,
despregadas, vestirão
um corpo de desejo ávido.

terça-feira, 26 de maio de 2009

dois pra lá, dois pra cá

pronto, você é a minha musa!

não é assim...

por que não, se é tão mais fácil?

mas não é assim, eu não quero ser sua musa.

não?

bom, ainda não...mas

esse teu mas é como um violão quebrado na minha cabeça.

não quero ser musa, acho. falei.

então, quer ser minha namorada?

melhor, muito melhor.

deram-se as mãos, beijam-se na boca e vão por ai. ele, sem musa, ela, sem poeta. algo me diz que podemos chamar isso de habitar poeticamente o mundo.

ah, dançam todo sábado na gafieira.

sábado, 23 de maio de 2009

Não vamos falar de solidão
... que custa muito a acabar e é assunto sem volta.
Tampouco vamos falar de politica
...que ao lado de religião e futebol, não ouso.
E passado é assunto já pra lá de passado
...que é só poeira, entulho, glória e lamento.
O diacho diz pra eu falar de sentimento
...que é jogo de empate, mas todo mundo quer ganhar.
Convém falarmos da natureza
..que é beleza até...ser tocada.
Palestremos então sobre seu Zé, aquele do bar
...que é pra falar de tudo e acabar falando nada.

Do que vamos falar, meu amigo
Nesse princípio de madrugada?

Não sei, vamos falar, só falar
Me vexo demais em ver aqueles
Que, por medo de não saber o que falar,
Não falam e não se livram de se curar?

Curar de quê, cara-pálida?

Não sei, de uma doença qualquer
Porque a gente só adoece e se cura falando
Pra dentro, pra fora, pra alguém, pra nada.

Deixe de extremo e passe logo a gelada

É esse clima aí, malandro!

*essa idéia de adoecer e se curar na linguagem é na verdade algo que li em BARTHES, Roland.

terça-feira, 19 de maio de 2009

Eu quero ver verdejar

O pai toma seu filho pela mão
Caminhavam pela praia lotada
Em meio a tudo, ele pára
Olha nos olhos seu filho
...
O tempo correu, correu muito
Parecia ontem que cantava
"O filho que eu quero ter"
E chorava na janela da condução
...
Estava lá, parado e olhando
Repleto de encanto e magnamidade
Depois servil e plácido
Espelhando candura no olhar

...
O tempo não é esconderijo
Mas é bem a nossa morada
Olhando seu filho, sentiu
Todos seus passos na estrada

...
Dissera, não largarei nunca
A tua mão que é frágil
Mesmo quando o tempo
Te fingir que ela é segura

...
Não sei o que faça, nem o que diga
Tenho em meus braços
Uma pequena onda de mim
Quebrada nas praias sem fim

..
Tenho em meus braços
Meu menino camarada
Aquele que na jornada
Verdejará por mim.

quinta-feira, 14 de maio de 2009

À fina força

Quarto meio escuro, mas sem alarde. O escuro deixa meus sentidos mais atentos.

Tenho pensado sobre o que me constitui, de que material sou feito, qual sua durabilidade, qual seu nível de elasticidade. Pressionado, resiste quanto tempo, e quando curvado em excesso, dilacera assim, fácil fácil ou permanece?
Sujeito a altíssimas temperaturas resiste mais que um soldado de chumbo?Aliás, é de leveza que me constituo, etéro e solto no ar ou fixo como mesinha de telefone no chão?

...um quilo de pena ou de chumbo, não interessa, sempre um quilo.

Ah, sei algo de fato sobre o material que me constitui. Procura adaptar-se,mais que isso, procura.
Mas nisso entra então numa boa enrascada. Dia desses eu andei com passos desatentos, só andei e me veio

"O que não se obtém a grosso modo, é porque virá à fina força"

Isso veio. Isso veio depois que assisti a uma palestra da biógrafa do Cartola que conviceu com ele durante anos. Ela falava, eu me arrepiava, lagrima contida, no canto.
Sai de lá, entrei na Carioca, peguei minha condução e sentei a pensar...a sentir... e me veio

"O que não se obtém a grosso modo, é porque virá à fina força"

E chega de demanda, malandro, pretender a vida é melhor que sonhá-la.

Deise, feito o "Barão nas árvores" (Italo Calvino) eu subí numa árvore, fiquei lá, mas descí, só descí.

Just a Monkey Man.

sábado, 2 de maio de 2009

'só os meus vícios que eu gosto de guardar'

'you´re my inspiration, please, remember me'
Beatles

Queria gastar os dias com inspiração pra que eles nunca se desgastem. Sei que assim falando parece que pretendo realizar um sonho, é bem isso. Mas entenda, inspiração não como divino, sagrado ou por aí.
Inspiração como voltar o olhar pro outro e deixar o outro retribuir o olhar. Há nesse movimento algo completamente incompreensível, um gesto de amor. De início já é bastante incomum nos permitirmos esse movimento, pois gesticular pras coisas apenas é desprezar o gesto das coisas pra nós, e quando eu, você, qualquer se permite esse instante-polaróide, eis, é inspiração.Sabemos, que no fundo, não estamos sozinhos, sabemos que há algo que 'existe', e que talvez nunca será explicado, deturpado, retorcido e da qual muitos duvidam que exista até.

Há também quem se proste esperando o gesto das coisas, o olhar do outro e não gesticula,nem age. Qua falta de inspiração! Sentar na beira do mar,achar lindo a onda lambendo a ponta dos seus pés, e o mergulho que era pra ser no mar, acaba sendo em si mesmo, encimesmado.

Inspire fundo, Martha, my dear, I say it just to reach you.

E agora, Monkey Man, vamos no esquema 'café pra acordar'...


saudações universais.